quinta-feira, 31 de maio de 2012

Denúncias marcam audiência da CPMI da Mulher no ES




A omissão do estado na morte de Fernanda Rodrigues Crisóstomo foi denunciada à CPMI da Violência contra a Mulher durante audiência pública da Comissão, realizada nesta sexta-feira (11/5), na Assembleia Legislativa do Espírito Santo.

O caso foi considerado emblemático pela CPMI, pois ao longo de quase dois meses, Fernanda recorreu à Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher, ao Ministério Público e à Vara de Violência Doméstica, na tentativa de obter proteção do estado. Tudo em vão: acabou sendo morta no dia 29 de fevereiro deste ano à espera de atendimento.

A CPMI, que tem justamente o objetivo de apurar o cumprimento da lei na proteção de mulheres vítimas de violência, também recebeu a denúncia de crime que teria sido praticado por um deputado estadual, caso sobre o qual deverá ser encaminhado requerimento de informação ao Ministério Público e representação perante à Assembleia Legislativa para instauração de processo disciplinar.

A audiência pública contou com participação expressiva da sociedade civil e do movimento de mulheres, que lotaram o auditório e a galeria do Plenário da Assembleia. Além das integrantes da Comissão, a presidente Jô Moraes (PCdoB-MG), a relatora Ana Rita (PT-ES) e a deputada Suely Vidigal (PDT-ES), participaram também da audiência a vice presidente da Câmara dos Deputados, Rose de Freitas (PMDB-ES), a deputada federal e ex ministra de mulheres do governo Dilma, Iriny Lopes (PT-ES), o senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES), os deputados federais Audifax Barcellos (PSB-ES) e Lelo Coimbra (PMDB-ES) e os deputados estaduais Cláudio Vereza (PT-ES), Genivaldo Lievore (PT-ES), Roberto Carlos (PT-ES) e Luzia Toledo (PMDB-ES).

A audiência pública, considerada a mais importante das realizadas pela CPMI, por ser o Espírito Santo o estado que lidera o ranking nacional de assassinato de mulheres, de acordo com dados do Instituto Sangari, indagou sobre as políticas que o estado tem adotado para prevenir, inibir e punir a violência cometida contra as mulheres.

A presidente e a relatora da Comissão, após realizarem diligência nos equipamentos do estado, destacaram preocupação com a ausência de políticas públicas estruturadas, que se reflete na falta de estrutura física nas delegacias, na escassez de pessoal, na carência de profissionais qualificados e na falta de varas especializadas.

Ana Rita afirmou que o Brasil possui um conjunto de legislação importante para o enfrentamento da violência contras as mulheres, a exemplo da Lei Maria da Penha, mas os números de casos de violência continuam aumentando, resultado de uma cultura machista e patriarcal profundamente arraigada na sociedade brasileira.

A CPMI questionou o poder público, representado na audiência pela juíza Hermínia Azzuri, coordenadora da violência doméstica e familiar do Tribunal de Justiça do estado; pela Dra. ZulmiraTeixeira, promotora de justiça do Ministério Público estadual; pelo defensor público geral, Gilmar Alves Batista; e pelos secretários estaduais, de segurança pública, Henrique Herkenhoff,; de assistência social e direitos humanos, Rodrigo Coelho; de saúde, Tadeu Marino e de Justiça, Ângelo Roncalli.

Indagados sobre a análise crítica que o estado do Espírito Santo faz por ser há mais de 10 anos o estado do Brasil mais violento para as mulheres, sobre as políticas públicas existentes na área e sobre o orçamento destinado para o enfrentamento à violência contra a mulher, todos foram unânimes em reconhecer que a liderança do estado em número de femicídios se dá pela ausência de políticas públicas eficazes para o enfrentamento à violência cometida contra as mulheres capixabas.

Ações
O secretário de Estado de Segurança Pública, Henrique Herkenhoff, admitiu os índices elevados de femicídios no Estado e garantiu que o número de delegados e escrivães será dobrado nas DEAM´s e que elas funcionarão 24h na Grande Vitória.

O secretário afirmou, ainda, que as políticas públicas dependem também do conhecimento do problema. Admitiu que a Lei Maria da Penha é cumprida de forma irregular, até mesmo pela falta de efetivo policial, mas informou ter baixado Portaria para que as autoridades policiais cumpram integralmente a Lei.

Já o secretário de Estado de Saúde, Tadeu Marino, acredita que faltam políticas públicas para enfrentar essa violência, mas questões culturais e sociais também devem ser levadas em consideração. Alegou que a rede de atendimento às mulheres vítimas de violência está funcionando e será ampliada.“Grande parte dos hospitais atendem e não notificam os casos. Orientamos para que essas mulheres tenham assistência e não sejam também vítimas de preconceito”, disse Marino.

O secretário de Assistência Social do Estado, Rodrigo Coelho, entregou à CPMI um relatório com as sugestões da pasta para minimizar o problema. No documento, Coelho detalhou quando e onde estão sendo investidas verbas estaduais para o enfrentamento à violência contra a mulher.

Já o secretário de Justiça, Ângelo Roncalli garantiu haver um sistema carcerário especial para as mulheres e afirmou que não faltará vaga nas prisões femininas.

Ao final da audiência pública, que durou mais de quatro horas, representantes da sociedade civil organizada deram suas contribuições à CPMI e cobraram ações efetivas do Poder Público estadual para que o Espírito Santo deixe de ocupar o desastroso lugar no topo do ranking da violência contra a mulher.

Diligências e visitas
No Espírito Santo, as integrantes da CPMI percorreram órgãos públicos em busca de dados sobre a execução do serviço de atendimento e prevenção à violência contra mulheres.

A primeira diligência, realizada na tarde da última quinta-feira (10/5), foi à Delegacia de Defesa da Mulher de Vila Velha, município que registra um dos maiores índices de violência contra mulher no país.

Em Vila Velha, a Comissão recolheu dados e informações sobre o atendimento às mulheres vítimas de violência e verificou as principais dificuldades encontradas para a realização dos trabalhos, entre elas, a carência de pessoal e estrutura física inadequada. Logo após a senadora Ana Rita, participou de reunião com o movimento de mulheres do Espírito Santo.

Antes da audiência pública, a comitiva constituída pela presidenta e a relatora, e a deputada federal Suely Vidigal (PDT-ES) esteve com o governador, Renato Casagrande (PSB) e seu vice Givaldo Vieira, secrertários estaduais e a coordenadora de políticas para as mulheres do estado, Laudicéia Schuaba.

As parlamentares visitaram, também, o Centro de Antendimento às Vítimias de Violência e Discriminação (CAVVID), em Vitória, que tem boa estrutura, mas uma rede não de todo integrada. No roteiro da CPMI ainda estiveram visitas ao Procurador do Ministério Público estadual, Eder Pontes e ao presidente do Tribunal de Justiça do Espírito Santo, desembargador Pedro Valls Feu Rosa.


Wanderson Mansur (Assessora de Imprensa da senadora Ana Rita PT-ES) com ALES

domingo, 1 de abril de 2012

3ª Conferência Municipal de Políticas para Mulheres


A 3ª Conferência Municipal de Políticas para as Mulheres levou centenas de pessoas ao Teatro Municipal de Vila Velha, na última segunda-feira (22). O encontro teve o objetivo de discutir e elaborar políticas públicas voltadas à construção da igualdade, tendo como perspectiva o fortalecimento da autonomia econômica, cultural e política, contribuindo para a erradicação da extrema pobreza e para o exercício da cidadania das mulheres no Brasil.

Na abertura do evento, o prefeito em exercício, Marcos Rodrigues, disse que a Prefeitura está trabalhando para o fortalecimento das ações da rede de apoio à mulher, ressaltando a importância do Conselho Municipal de Direitos e Defesa da Mulher (Comddim), ligado à Secretaria de Ação Social e Cidadania (Semas). “Conseguimos reativar e reestruturar os conselhos, que estavam sem funcionar, e agora estamos realizando as conferências, demonstrando que esta gestão acredita na parceria entre o poder público e a sociedade civil organizada para melhorar cada vez mais a vida da nossa população”, pontuou Marcos Rodrigues.

Segundo a coordenadora de Políticas Publicas para Mulheres do Espírito Santo, Laudicéia Schuaba de Andrade, para fortalecer a atuação dos organismos de políticas para as mulheres é necessária a participação das três esferas: municipal, estadual e federal. “Estamos nos preparando para a conferência estadual e nacional, onde apresentaremos propostas para o fortalecimento do universo da mulher, especialmente quanto à execução dos programas que valorizam a mulher, defendem e lhe oferecem oportunidades de crescimento e de combate à violência”, falou Laudicéia.

No segundo dia de programação do evento, nesta terça-feira (23), serão realizadas palestras, debates, trabalhos em grupos com eixos temáticos e apresentações culturais. Tudo isso para analisar a realidade social, econômica, cultural e os desafios para a construção da igualdade de gênero, além de avaliar e aprimorar as ações e políticas que integram o Plano Municipal de Políticas para Mulheres.

No primeiro dia da conferência participaram representantes da rede de apoio à mulher, associações de bairros, universidades, técnicos do CRAS e do CREAS, membros de conselhos municipais e vários segmentos governamentais e não-governamentais.
Texto: Regina Alves / Fotos: Eduardo Ribeiro

FONTE: http://paixaocapixaba.com.br/?p=3290 (Acesso em Março de 2012)

Primeiro negro capixaba desembargador do Tribunal de Justiça é de Alegre/ES

Igualdade.
Essa foi a palavra que norteou o discurso de posse do desembargador Willian Silva, primeiro negro a assumir um vaga na Corte dowillian_desembargador Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES).

“Sou negro, da pele preta com orgulho”, pontuou. Willian é nascido no distrito de Celina, em Alegre, Região do Caparaó. Ele destaca que tem orgulho da origem humilde. Ainda pequeno, junto com sua família, foi um dos fundadores do bairro da Penha, em Vitória. “Saí de Alegre para ajudar com meus pais a fundar o Bairro da Penha (Morro da Penha), e, como ajudante de pedreiro, trabalhei na construção da casa onde residi na juventude. Lá, dentre vários que viviam na marginalidade, preferi e escolhi estudar para ser o primeiro da família a acessar um curso superior e um dos poucos negros, à época, a atingir tal realização”, afirmou.


O desembargador Willian Silva disse ainda, emocionado, que conseguiu chegar ao cargo porque acreditou que podia fazer a diferença e, assim, lutou contra todas as barreiras que lhe foram impostas ela vida: “Lutei contra a pobreza, o preconceito, a discriminação e a desigualdade social que, lamentavelmente, ainda há no Brasil”. Ele ainda pediu que todos que passam pela mesma situação acreditem na vitória. Para abordar as várias formas de desigualdades encontradas atualmente na sociedade, Willian Silva citou o caso ocorrido no São Paulo Fashion Week de 2009, quando o Ministério Público do Estado abriu inquérito civil público para apurar o preterimento de modelos negras. “A estilista Glória Coelho, chamada a prestar depoimento sobre o fato, disse: na Fashion Week já tem muito negro costurando, fazendo modelagem, muitos com mãos de ouro, fazendo coisas lindas, tem negros assistentes, vendedoras, faxineiras, por que tem de estar na passarela?”, pontuou. “Imagina se ela me vir aqui tomando posse como desembargador?”.


willian_desembargador2Ao final do seu discurso, o novo integrante da Corte ressaltou a pretensão que tinha de assumir antes o cargo, mas ponderou que, apesar do atraso, não podia ter assumido em melhor hora. “Sonhei em chegar antes, mas o horário de Deus é diferente do nosso. Chego na hora certa para unir esforços à Mesa Diretora na construção de um novo Judiciário”. Durante o evento, o desembargador Willian Silva ganhou o colar de Mérito Judiciário, concedido aos desembargadores no ato em que assumem oficialmente uma vaga no TJES. Na ocasião, em nome dos colegas, o desembargador Ronaldo Gonçalves de Sousa, fez o discurso de boas vindas. Em sua fala, Ronaldo Sousa, comemorou a conquista do amigo pessoal, que conheceu há três décadas. “ Willian Silva exerce com brilhantismo na concretização do Direito”, ressaltou o desembargador, que ainda brincou com o sotaque adquirido pelo colega e do gosto pelo futebol.

 

Com informações da Assessoria de Comunicação do TJES
Fotos: TJES / Gazetaonline
Confira entrevista com o Desembargador Alegrense Willian Silva para a TV Gazeta.




Confira aqui (http://g1.globo.com/videos/espirito-santo/v/tj-es-da-posse-ao-primeiro-capixaba-negro-a-chegar-ao-posto-de-desembargador/1804656/) uma entrevista com o Desembargador Alegrense Willian Silva para a TV Gazeta.
Com informações da Assessoria de Comunicação do TJES
Fotos: TJES / Gazetaonline

sábado, 31 de março de 2012

Primeira Mulher negra a se tornar juíza no Brasil

Luislinda Dias Valois dos Santos afirma que ainda existe muito preconceito no País
Texto: Marcela Rossetto Foto: Mônica Tagliapietra


O título de primeira mulher negra a se tornar juíza no Brasil é apenas um dos que a magistrada baiana Luislinda Dias de Valois Santos somou ao longo de sua carreira no Judiciário.
Aos 68 anos de idade, 26 anos de magistratura e 51 anos de serviço público, inclusive na área federal, como procuradora autárquica, Luislinda já foi homenageada e premiada em diversas esferas públicas e entidades no País e no exterior pelos projetos de inclusão e acesso à Justiça desenvolvidos nas comarcas por onde passou - e foram 11, além da atual, na capital do estado, Salvador.
Consciente de que é parâmetro de sucesso para a raça negra, defende o sistema de cotas (mas não indefinidamente), acredita que a Lei contra o Racismo ainda não é muito bem utilizada e afirma que o preconceito existe, sim, no Brasil, apesar das tentativas de se esconder isso. "Quem quiser saber o que é ser negro, fique negro por apenas 24 horas" é sua máxima para quem duvida de que exista discriminação racial no País.
Luislinda Valois já foi vítima de preconceito no exercício da magistratura, mas afirma que com "simplicidade, lhaneza e altivez" sempre resolveu essas situações. Seu único lamento - e desafio constante - é ainda não ter se tornado desembargadora no Tribunal de Justiça da Bahia.
Nesta entrevista concedida por e-mail à Visão Jurídica, a juíza Luislinda Valois fala de Direito, raça, preconceito e do seu modo de ver a vida. "Sou lutadora, tenho uma vida reta", afirma a magistrada que já recebeu as alcunhas de juíza maleira, porque não tinha espaço para trabalhar; juíza euquipe, porque não tinha funcionários e Ruy Barbosa de Saia, o que dispensa explicações.



 Visão Jurídica
 1) A senhora foi a primeira mulher negra a ser tornar juíza no Brasil. Qual o impacto disso na sua vida e na profissão?
Luislinda Dias de Valois Santos
 - Não levo em conta se sou a primeira ou a última mulher negra a ser juíza no Brasil. Para mim, o que interessa é ter coragem de dizer o que precisa ser dito a tempo e a hora. E isso eu faço porque sou totalmente independente, aliás, só dependo de Deus e dos meus Orixás. Minha vida e minha profissão sempre foram, são e serão pautadas no labor pelo bem da humanidade.

 
2) A senhora se considera um símbolo ou um exemplo para o movimento negro?
Luislinda Dias de Valois Santos

 - Não sou nem uma coisa nem outra, apenas luto e lutarei enquanto forças tiver, para ver, não apenas o negro, mas todos os excluídos - cadeirantes, gays, lésbicas, prostitutas, simpatizantes - atendidos por políticas públicas reais e verdadeiras.

3) O que a motivou a escolher o Direito e a carreira da magistratura?
Luislinda Dias de Valois Santos
 - Creio que fui estimulada a fazer Direito e depois tornar-me magistrada por causa das palavras discriminatórias do meu professor, que tentou me fazer acreditar que eu seria uma boa cozinheira em virtude dos meus pais não terem comprado o material de desenho que ele havia indicado. Ditas palavras me chegaram aos ouvidos quando eu tinha apenas 9 anos de idade em plena sala de aula.

4) O Judiciário brasileiro é preconceituoso? Por quê?
Luislinda Dias de Valois Santos
 - O Judiciário não é preconceituoso, apenas nos seus quadros existem, como em todas as esferas, profissionais preconceituosos.
Vale dizer que o Judiciário brasileiro não tem o histórico de grande número de magistrados negros integrarem os seus quadros. A situação fica mais difícil quando constatamos que durante a sua existência, pelo menos que eu saiba, nenhum Tribunal pátrio teve um presidente negro, mas já é perceptível que a situação está mudando, até porque o negro está mais unido e lutando pelos seus direitos, sem esquecer suas obrigações e seus deveres.
Todavia, quero crer que muito em breve teremos mais negros não apenas ocupando espaços de execução e apoio, mas exercendo cargos de ministros de Estado, presidentes de Tribunais, governadores, prefeitos, presidente da República, senadores, executivos de empresas multinacionais, procuradores etc., até porque também somos competentes; falta-nos apenas oportunidade.
Mas o Judiciário também está mudando. Aqui, ali e alhures já nos deparamos com magistrados negros (ministros, desembargadores, juízes) atuando nesse grandioso e indispensável poder.
5) A senhora, pessoalmente, já enfrentou preconceito no exercício da magistratura em razão de ser mulher e negra?
Luislinda Dias de Valois Santos

 - Já. Algumas vezes advogados e partes não acreditam que sou a juíza da Unidade Judicial. Ficam assustados quando me veem negra, com cabelo rastafári vermelho e usando contas dos meus Orixás à mostra. Em duas oportunidades tive que fazer valer a minha autoridade para que as advogadas acreditassem que eu era a juíza daquele Juizado, sendo que em uma delas a advogada sentada na cadeira do magistrado dizia-me que não iria levantar-se porque aquela cadeira "era do juiz", e não minha. Certamente ela esperava acima de tudo um juiz, jamais uma juíza com o meu perfil.
Mas, com minha simplicidade, lhaneza e altivez necessária coloco todas as pessoas nos seus devidos lugares. Afinal, sou Filha de Iansã. E ainda se proclama que no Brasil não existe nem racismo nem preconceito, daí a minha máxima: "Quem quiser saber o que é ser negro, fique negro por apenas 24 horas". Antes o prazo era de 48 horas, mas diante da gravidade da situação, prefiro fixá-lo em 24 horas.
Vale dizer que o Judiciário brasileiro não tem o histórico de grande número de magistrados negros integrarem os seus quadros.


6) Qual o maior obstáculo que a senhora já enfrentou na carreira?
Luislinda Dias de Valois Santos

 - O maior obstáculo que já enfrentei na carreira foi para alçar ao cargo de desembargadora, apesar dos meus méritos profissionais serem reconhecidos mundialmente, inclusive através de duas entrevistas à BBC de Londres, que me indagava porque eu ainda não era desembargadora; indicação para representar a Mulher Negra no Fórum Mundial das Águas, juntamente com Danielle Mitterrand [viúva do ex-presidente francês François Mitterrand]; ter sido homenageada pela revista Eco Turismo em virtude dos relevantes serviços prestados ao Brasil e ao planeta; ter proferido palestra em evento da ONU e outras premiações auferidas em virtude do meu labor judicante. Mas sou persistente, não desisto, até porque sei que atrás de mim vem uma "onda negra de sucesso e do bem" para a qual eu sirvo de parâmetro.

7) É sabido que a maioria da população carcerária brasileira é formada por jovens pobres e negros. O que a senhora tem a dizer sobre isso?
Luislinda Dias de Valois Santos

- Sem dúvida. O que ocorre é que ao preto, pobre e periférico (PPP) não se dá oportunidade sequer de estudar. Aos PPPs a educação que se lhes oferece não é de qualidade e não é continuada. Em um mundo globalizado, com uma concorrência desfiadora, não é possível acreditar que o cidadão que concluiu o fundamental em escolas públicas como as que temos atualmente está pronto para um mercado de trabalho tão competitivo.
De outra parte, constato que os pais não cuidam dos seus filhos, alegando os mais diversos e absurdos motivos. Diz-se até que é para que eles, os filhos, não fiquem traumatizados. Na medida do possível, tentam compensar o seu desleixo com coisas materiais. Então, esses jovens são atraídos pelo consumismo, cujos convites entram a todo instante nas nossas casas. Assim, não tendo o controle e a vigilância familiar, se deparando com o chamado para as comparas e com seu estado de pobreza, partem para a delinquência e ao final se encontram com o cárcere e/ou com o cemitério.
Urgem, pois, políticas públicas reais, sérias e urgentes, antes que a raça negra seja exterminada. A situação não será resolvida com a redução da idade penal, mas sim com igualdade de oportunidades para todos os brasileiros e orientação familiar.

8) O juiz deve levar em consideração questões histórico-sociais-raciais no momento de prolatar uma sentença cujo réu é negro?
Luislinda Dias de Valois Santos

- Não. Absolutamente não. A "era" da escravidão é coisa do passado. Mas vez por outra isso se torna uma realidade, não por culpa do magistrado, mas em virtude do histórico brasileiro, que sempre viu e ainda vê, infelizmente, o negro como feio, malvestido, incompetente, tocador de tambor, dançarinas do carnaval e até como "coisa", como dizia o Sr. Nina Rodrigues [médico e antropólogo brasileiro, fundador da antropologia criminal brasileira e pioneiro nos estudos sobre a cultura negra no País. Desenvolveu teses racistas sobre a degeneração do brasileiro em razão dos negros e mestiços].

9) A senhora deu a primeira sentença no Brasil utilizando a Lei do Racismo, mas esta norma vem sendo pouco aplicada de maneira geral. O Brasil está menos preconceituoso ou as pessoas não têm conseguido fazer valer seus direitos no Judiciário?
Luislinda Dias de Valois Santos
  
- A lei antirracismo nem sempre é aplicada até porque ela ainda é acionada timidamente por quem se vê vitimado por atitude tão abominável. Vale ainda dizer que em virtude da suntuosidade das dependências do Judiciário, o negro tem medo de ir até ele a fim de ver declarado o seu direito. Todavia, observo que a situação é de mudança porque, depois da Constituição Federal de l988, os brasileiros estão exercitando mais e mais os seus direitos.
A lei antirracismo nem sempre é aplicada até porque ela ainda é acionada timidamente por quem se vê vitimado por atitude tão abominável.

10) Uma das características da sua atuação profissional é a busca pela facilitação do acesso à Justiça, inclusive, criando e desenvolvendo projetos na Bahia nesse sentido e ganhando prêmios. Poderia falar algo sobre esse trabalho?
Luislinda Dias de Valois Santos

 - Para facilitar o acesso à justiça realmente criei e implantei alguns projetos, objetivando levar a Justiça célere até o povo, principalmente a população mais pobre. Eis alguns dos programas exitosos: Justiça, Escola e Cidadania; Fome Zero de Justiça; Lendo, Estudando e Aguardando Justiça; Juizado Marítimo Baía De Todos os Santos - para atender os cidadãos que residem nas ilhas marítimas da Baía de Todos os Santos -, Justiça Itinerante Bairro a Bairro, Balcão de Justiça e Cidadania; Inclua no Trabalho e na Educação e Exclua da Prisão. E dezenas e outros.
Foi um trabalho árduo, porém exitoso e gratificante, sendo que alguns desses programas estão sendo copiados e implantados em Unidades da Federação e fora do Brasil, valendo noticiar que um exemplar do Relatório de tais atividades, dando conta de todos os trabalhos elencados foi encaminhado à Sua Excelência presidente dos Estados Unidos da América, Barack Obama, por solicitação de uma de suas assessoras, que também homenageou esta entrevistada com o bottom do dia da posse daquele grandioso presidente.

11) A senhora é a favor do sistema de cotas no ensino superior?
Luislinda Dias de Valois Santos

- Sou a favor das cotas no ensino superior e advogo a manutenção dessa política até que o ensino das escolas públicas alcance o mesmo nível das escolas particulares. Sou também favorável a que se criem cotas para negros nos concursos públicos. Não é bondade. É dever do Estado brasileiro, a fim reparar um pouco as misérias que permitiram se praticasse contra esta raça forte, porque, se assim não fosse, restaria exterminada. Agora, sou contra a sua eternização, para que não se configure esmola, até porque o que nós, negros, buscamos é a igualdade de tratamento para todos os brasileiros, conforme preceitua o art. 5º da nossa Carta Cidadã.

12) Qual sua opinião sobre a Lei Maria da Penha? Há uma corrente que defende sua aplicação quando a vítima é homem. Qual sua posição?
Luislinda Dias de Valois Santos

- A Lei Maria da Penha adveio de um momento de indignação e euforia, daí a sua imperfeição, mas está aí e tem que ser respeitada e aplicada tanto em relação ao homem quanto em relação à mulher, até porque, se todos somos iguais, para que uma lei para o homem e outra para a mulher? Afinal, o homem também pode ser vítima de uma ação violenta da mulher. É o meu pensamento.
Sou a favor das cotas no ensino superior e advogo a manutenção dessa política até que o ensino das escolas públicas alcance o mesmo nível das escolas particulares.

13) Na sua opinião, qual o melhor caminho para o enfrentamento e a consequente diminuição da discriminação e do preconceito na sociedade brasileira?
Luislinda Dias de Valois Santos

- A consciência de que todos somos iguais, o que certamente demandará tempo, porque o sentimento escravocrata ainda está muito arraigado no povo brasileiro que insiste, mas não consegue, camuflar a sua condição de discriminador e preconceituoso.

14) Que mensagem a senhora pode deixar para os estudantes de Direito e jovens profissionais da área jurídica de todas as raças do século XXI?
Luislinda Dias de Valois Santos

- A mensagem é que, antes de tudo, precisamos ser éticos, honestos, probos e competentes, porque se assim não agirmos jamais faremos a justiça que tanto necessitamos. Devo dizer mais, que, se somos competentes, éticos e honestos, este é o tempo de conquistarmos interna e externamente a certeza de que somos capazes de fazer um Brasil mais justo e melhor para todos os brasileiros, inclusive nós mesmos.
Aceitem, pois, os desafios sem medo, porque para quem é decidido nem mesmo o céu é o limite.
"NAHNU BRAZILIYUN" (em árabe) = NÓS SOMOS BRASILEIROS.
Entrevista publicada no site: https://revistavisaojuridica.uol.com.br/advogados (acessado em 27/03/12 às 18hs).


COMENTÁRIO REFERENTE AO TEXTO, FEITO POR ROSA ELAINE:
Quando comecei estudar a temática deste módulo “Estado, Sociedade e Cidadania”, fiquei me perguntando sobre algo interessante que pudéssemos postar em nosso Blog “Mulheres de Raça”, foi quando ouvi falar no nome dessa brasileira que acima está sua entrevista e comecei a pesquisar, porque achei fantástica sua história e tudo a ver com o que estava estudando, comecei a pesquisar na internet e achei diversas publicações a respeito, mas fiquei me perguntando, porque histórias como essa não são exploradas pela mídia?  A história de Luislinda Dias Valois, é importante para que possamos dela mostrarmos que sim, a mulher negra pode e deve se permitir ter direitos numa sociedade que lhes garante esses direitos em forma de leis.
Contudo, algumas pessoas podem me perguntar, mas porque a história de uma juíza? Por que essa é uma das esferas de poder de nosso país e porque a magistratura é uma carreira até então inimaginável para pobre e pessoas sem origem, ou seja, tradição familiar na justiça brasileira.
Portanto, essa entrevista tudo tem a ver com o curso no qual estamos nos graduando e nos tornando gestores em Políticas Públicas de Gênero e Raça, e que muito poderemos contribuir para que histórias como essas não sejam exceção e sim regra, quando lá no artigo 5º de nossa carta magna diz que todos somos  iguais é para que isso seja fato em direitos e garantias e nós a partir deste curso seremos fundamentais para que tais políticas aconteçam e aconteçam para todos.
Foi muito bom conhecer essa história, mesmo sabendo que a primeira juíza negra em nosso país só teve oportunidade 30 (trinta) anos, depois da primeira juíza mulher assumir o posto no Brasil no ano de 1954 no Estado de Santa Catarina quando Thereza Grivólia Tang, assumiu a função, somente em 1984 tivemos a primeira mulher negra a assumir o mesmo posto no Brasil no Estado da Bahia.
Que histórias de vida como essa seja um exemplo e um caminho a ser perseguido por muitas outras mulheres nos dias atuais, para que, quem sabe num futuro bem próximo possamos comemorar por vivermos numa sociedade onde o direito as diferenças não só a de gênero, mas também no que tange a raça seja abolida de nossa sociedade.




CASOS DE RACISMO NO BRASIL

por Francisco Sampa

Passados 121 anos da abolição da escravatura e depois da assinatura de várias leis contra a discriminação, casos desta natureza ainda acontecem em várias partes do Brasil, envolvendo pessoas famosas e anônimas.
A nota a seguir foi publicada na coluna Zapping na edição de terça-feira, dia 28 de abril, no jornal Folha de São Paulo:
“A atriz Christiane Torloni, de "Caminho das Índias", levou advertência da Globo depois que uma camareira negra, chamada Fátima, a acusou de ser tratada de forma discriminatória e procurou o departamento de recursos humanos para fazer reclamação formal. O desentendimento entre as duas foi presenciado por gente da produção da Globo e pela atriz Letícia Sabatella. Durante intervalo de gravação externa da novela, em um ônibus usado como camarim, a camareira perguntou se a atriz precisava de algo. Christiane olhou e perguntou: "O que você quer, está me seguindo? Sai, sai. Ô raça". A Globo não confirma que houve qualquer tipo de punição contra ela. A atriz nega a acusação. Em outra ocasião, Luana Piovani também teve problema na Globo. Foi acusada de agressão por uma produtora e afastada da gravação do "Faça sua História"


OUTRO CASO

Esther Sanches Naek, líder comunitária e Juiza de Paz radicada na cidade de Tolland no estado de Conneticut, com forte militância política e atuação na área social no seio da comunidade brasileira, tendo seus serviços reconhecidos por autoridades brasileiras e norte americanas, visitou nossa redação na segunda-feira, dia 27 de abril e nos relatou a história que ocorreu com ela na cidade Belo Horizonte, capital de Minas Gerais.

Na capital mineira contratou os serviços de sua hospedagem em Belo Horizonte, no Hotel LIBERTY SAVASSI, localizado à Rua Paraiba, 1485 na Savassi. Ali chegando no dia 25 de março último, vestida de jeans e usando sandálias sem salto, porém após a longa viagem recebeu tratamento que não condiz com o seu status de consumidora pelo atendente/recepcionista de nome GERALDO. Ele, demonstrando desprezo para com ela a ela, jogou as chaves do quarto no balcão de check-in. Não deu informações sobre como chegar aos aposentos e, especialmente perguntado, limitou-se a responder secamente: "o número do quarto está na chave". Outro atendente/carregador, um afro-descendente, aproximou-se e, com presteza, se dispôs a carregar a bagagem, acompanhando-a até o quarto. Nesse espaço, a retratada comentou com o atendente/carregador que estava espantada com o mau atendimento recebido, ao que este replicou que, ali, era comum o mau humor e a indelicadeza na recepção.
Chegando ao quarto recebeu um telefonema do mesmo atendente de nome GERALDO, dizendo-lhe que se esquecera de pegar o cartão de crédito dela ou em espécie para cobrir duas diárias. Esther nessa oportunidade disse a ele sobre a sua indignação pelo mau atendimento e este retrucou dizendo que trabalhara por quatorze anos em hotéis em Nova York e que lá todo mundo era mal recebido.
Ao dizer-lhe que procuraria o gerente ele, destemidamente, disse que o fizesse. Esther imediatamente desceu para a área de recepção e ao ser vista pelo aludido atendente recebeu a fala de que ele já havia comentado com o gerente e que se ela quisesse podeira falar com ele. Esther disse que reclamaria diretamente com proprietária do hotel, dona MARIA JOSÉ CAPANEMA. Nessa oportunidade o recepcionista disse "fique a vontade, ela está ali", apontando para uma mesa próxima no hall do hotel.
Esther aproximou-se da proprietária e disse: "com licenca senhora, eu poderia ter a sua atenção por alguns minutos?", dona MARIA JOSÉ CAPANEMA instantaneamente olhou para e disse: "Você não está vendo que estou ocupada?" Nisso Esther disse que precisava apresentar uma reclamação por maus tratos do atendente e que esperaria. Ao se afastar por dois metros mais ou menos, daí a segundos dona MARIA JOSÉ CAPANEMA, já irada, disse a seus interlocutores, (ela estava conversando com duas pessoas na recepção), em altos brados "não se pode conversar com privacidade, deixa eu falar com esta mulher" Aproximando-se ela disse: "o que você quer?" , isto rispidamente.

A partir desse momento, vendo-se inteiramente mal recebida, disse que gostaria de fazer uma reclamação, mas que entendia o porquê de haver sido maltratada na recepção, já que a proprietária encorajava esse proceder com o aludido comportamento. E que, face às circunstâncias, solicitou que sua bagagem fosse devolvida e que ela procuraria outro hotel na cidade, no que foi prontamente atendida.
A líder comunitária sentiu-se e ainda se sente ultrajada, seja como cidadã consumidora, seja como pessoa e afro-descendente. Frise-se que, enquanto estava na recepção, um senhor de tez clara que chegou depois dela, foi pronta e educadamente atendido antes dela. Não é difícil concluir que houve, na base de tudo, um viés de descriminação racial e social. Por isso se sente tão insultada e isso na própria terra natal. Como líder comunitária aqui nos EUA e no Brasil, Esther atua em áreas de assistência social e saúde, incluindo, neste caso, nove instituições sendo sete mineiras: Alvinópolis, Governador Valadares, Rio Piracicaba, uma em Sombrio em Santa Catarina e uma em Fortaleza no Ceará.

VERSÃO DO HOTEL

Na tarde de terça-feira, dia 28 de abril, às 4h07 da tarde, ligamos da redação do jornal para o hotel através do telefone (031) 2121-0900 e fomos atendidos pelo Sr. Celso Morandi, que se identificou como gerente geral do hotel em questão e nos contou a seguinte versão dos fatos.

De acordo com Sr. Celso, a Sra. Esther fez a reserva com a atendente Lívia para 3 dias de estadia no hotel. Ao chegar para o fazer o check in, a Sra. Esther recusou-se a apresentar o cartão de crédito, o que conforme ele disse é uma praxe internacional, uma vez que não era uma hóspede regular e não tinha uma empresa responsável por sua hospedagem. O que requer, neste caso, que o hóspede apresente um cartão de crédito para depósito de segurança. Segundo ele, em nenhum momento levou em consideração fatores sociais ou mesmo raciais, foi apenas uma questão de ordem administrativa. Ainda, segundo sua informação, a Sra. Esther retirou-se do hotel e foi levada a outro estabelecimento hoteleiro onde, conforme informação do taxista, passou pelos mesmos problemas enfrentados em seu estabelecimento, ou seja, a recusa em apresentar o cartão de crédito para o depósito de segurança no HOTEL MERCURY, onde não se hospedou e acabou ficando no terceiro hotel, desta vez o MAX SAVASSI, no centro da capital mineira.

Fonte: http://www.brazilianpress.com/20090429/local/noticia03.htm (acessado em 30/03/12 às 8hs)

domingo, 11 de dezembro de 2011

Levantamento de Alunos Matriculados (EEEFM "Pedro Simão)


De um total de 927 alunos matriculados, 698 alunos são Negro/Pardos e 229 alunos são considerados de cor Branca.

FONTE: Dados da Escola

sábado, 10 de dezembro de 2011

POR UMA INFÂNCIA SEM RACISMO


Com a campanha Por uma infância sem racismo, o UNICEF e seus parceiros fazem um alerta à sociedade sobre os impactos do racismo na infância e adolescência e sobre a necessidade de uma mobilização social que assegure o respeito e a igualdade étnico-racial desde a infância.

Baseada na ideia de ação em rede, a campanha convida pessoas, organizações e governos a garantir direitos de cada criança e de cada adolescente no Brasil

CRIMES DE RACISMO

O problema do racismo é antigo. A legislação penal positiva brasileira vigora na égide do Código Penal de 1940, da era getulista. Voltando no tempo, o código penal em vigor era o da República, de 1890; antes dele o Código Criminal do Império de 1830 e antes do código do Império, vigoravam as Ordenações Filipinas, Livro V.

Nas Ordenações Filipinas, não encontramos, no livro V, nenhum tipo de preconceito; pelo contrário, a escravidão humana existia (negro, índio) e o livro V tratava da matéria, mas nenhum dispositivo condenava o racismo. Tinham dispositivos que estimulavam o racismo. Por exemplo: contra os judeus, ciganos, mouros, os quais eram obrigados a usar roupas e chapéus de determinada cor, forma etc. e, se não o fizessem, estariam praticando uma infração penal.

Em suma, nos primeiros tempos após o descobrimento, durante 300 anos, a nossa própria legislação penal estimulava a ação discriminatória, envolvendo certas e determinadas pessoas.

Proclamada a independência, passamos para o Código Criminal de 1830, no qual não figurava nenhum dispositivo consagrando ou prestigiando esse procedimento preconceituoso, mas também nada dizendo que racismo, preconceito envolvendo religião, sexo etc., configuraria infração penal.

A escravidão continuava e no Código Criminal de 1830, existia toda uma parte dedicada aos escravos, quando eles infringiam a lei penal. Eles recebiam tratamento diferente.

No artigo 60 do Código Criminal do Império, se o réu fosse escravo e incorresse em penas que não fossem a pena capital ou de galés, ele seria condenado à pena de açoites e depois, seria entregue ao seu senhor, que colocaria nele, escravo, um ferro pelo tempo e maneira que o juiz designasse.

Mais ainda, o número de açoites seria fixado na sentença e o escravo, não poderia levar mais de cinqüenta (açoites) por dia.

O mesmo se diga do Código da República, de 1890 que não trazia nenhuma alusão ao preconceito.

Verificado aqui no Brasil o movimento de Vargas, o Estado Novo, adotamos uma nova codificação penal que é o Código Penal de 1940.

Ocorrendo a revolução de 1964, partimos também para um novo código penal; foi o código de 1969, que não entrou em vigor, por circunstâncias diversas.

Continua em vigor o código de 1940, com muitas modificações e alterações.

No código de 1940 não há nenhum dispositivo a respeito de racismo ou de preconceito.

A expressão racismo é totalmente inadequada. O correto é usar preconceito.

Uma lei de 1951, a lei 1390/51 - Lei Afonso Arinos, dizia: "constitui infração penal (contravenção penal) punida nos termos dessa lei, a recusa por estabelecimento comercial ou de ensino, de qualquer natureza, de hospedar, servir, atender ou receber clientes, comprador ou não, o preconceito de raça ou de cor".

O que temos, através dessa lei e de leis posteriores, é o combate ao preconceito, à chamada ação discriminatória, que nem sempre envolve raça.

Quando falamos em racismo, limitamos a área de incidência do preconceito. As manifestações preconceituosas são muitas: podem envolver a raça, cor, idade, sexo, grupo social etc.

Preconceito é uma infração genérica; neste gênero chamamos de preconceito de: raça, cor, estado civil, sexo, inclinação religiosa etc. O preconceito é considerado contravenção penal.

O que a lei pune é o preconceito apenas de raça e cor. Preconceito é gênero; o que se combate realmente é o preconceito.

Em 1985, 34 anos depois da Lei Afonso Arinos, foi promulgada a lei nº 7437/85. Essa lei continua a considerar os comportamentos preconceituosos, meramente contravenção penal. Pela lei, a contravenção foi estendida para preconceito de: raça, cor, sexo, estado civil.

A idéia central continua a ser preconceito, mas a lei evoluiu pois aumentou o número de crimes de natureza preconceituosa. Preconceito de sexo é não permitir por exemplo a entrada de mulheres desacompanhadas em determinados lugares; isto acontecia em certos estabelecimentos em São Paulo, tais como boates, bares dançantes etc.

A Constituição de 1988, em seu art. 5º - inc. XLII, passou a considerar a prática do racismo como crime inafiançável e imprescritível.

O legislador falou em racismo, mas na verdade, o que ele queria dizer era preconceito. Preconceito é gênero, do qual o racismo é uma espécie. Por racismo, entende-se um preconceito que abrange a raça e no máximo, a cor das pessoas. O racismo não envolve preconceito de sexo, de estado civil ou de outra natureza.

O racismo então deixou de ser mera contravenção e ganhou o "status" de crime. Mas que crime? - Um crime particular, extraordinário, porque esse crime está sujeito sempre à pena de reclusão e mais do que isso, é um crime inafiançável e mais ainda, um crime imprescritível.

É claro que o racismo é um crime muito grave, mas fazer com que seja um crime imprescritível é um absurdo. É preciso que o direito de punir do Estado seja limitado no tempo; não pode um crime não prescrever nunca. Nos diplomas penais do mundo moderno, a prescrição começa a ser introduzida, pois a prescrição atenua aquele poder do Estado de a qualquer hora poder punir.

Para o Estado, a imprescritibilidade é uma coisa extraordinária, mas não o é evidentemente, uma garantia para o cidadão.

A prescrição é um instituto moderno e soberano em todos os códigos de todos os povos modernos. O legislador brasileiro retrocedeu séculos quando colocou como imprescritível o crime de racismo.

Diante da Constituição tinha que vir a lei ordinária nº 7716/89, que fala apenas em raça e cor. Essa lei pune expressamente o preconceito de raça e cor.

Em vista disso, da lei acima, com relação ao sexo e estado civil, continua em vigor a Lei 7436/85, que trata o delito como uma contravenção.

A Lei 8081/90 acrescentou o art. 20 à lei anterior:
Norma alterada pela Lei 8081
LEI 7.716 DE 05/01/1989 - DOU 06/01/1989
Define os Crimes Resultantes de Preconceitos de Raça ou de Cor.

ART. 20 - Praticar, induzir ou incitar, pelos meios de comunicação social ou por publicação de qualquer natureza, a discriminação ou preconceito de raça, cor, religião, etnia ou procedência nacional (grifo nosso).

Pena: reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos.

É apenas através da mídia, através da imprensa. A Lei, limitou esses atos, característicos de crime, à chamada publicação, aos anúncios em jornais e outros meios de comunicação.

Antes da lei, haviam anúncios de empregados procurados nos jornais, que davam preferência a candidatos nisseis, candidatos de orígem alemã, americana e assim por diante, criando uma barreira às pessoas de outras nacionalidades.

Esta seria a última lei a respeito do assunto.

A Lei 9092/95 de 13.04.95 proíbe a Exigência de Atestados de Gravidez e Esterilização, e outras Práticas Discriminatórias, para Efeitos Admissionais ou de Permanência da Relação Jurídica de Trabalho, proibindo a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso a relação de emprego, ou sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade.

No dia 16 de janeiro de 1996, foi sancionada a Lei Municipal de nº 11.995, que "veda qualquer forma de discriminação no acesso aos elevadores de todos os edifícios públicos municipais ou particulares, comerciais, industriais e residenciais multifamiliares existentes no Município de São Paulo.

FONTE: Autor: Edison Maluf, advogado, com Curso de Pós-Graduação em
Direito Penal pela FMU-SP, Mestre em Direito Penal pela PUC-SP,
Doutorando pela PUC-SP, Professor de Direito Penal na Universidade Paulista – São Paulo.

LEI CONTRA O RACISMO E A IDENTIFICAÇÃO DA PESSOA

A luta do povo negro no Brasil, por uma sociedade sem discriminação, sem preconceito e sem racismo, provocou a formulação da Lei no 7.716, de 5/1/89. O vigor dessa lei vem comprovar a existência de práticas discriminatória no Brasil. As leis de caráter restritivo são feitas para coibir comportamentos nocivos!

Temos acompanhando pelo rádio, pelos jornais, pela televisão, por revistas, e até mesmo presenciamos casos caracterizados como crime de racismo e conseqüentemente a aplicação da lei. É verdade que muitas vezes ocorre a descacterização do crime total.

Sentimos, diante da possibilidade de alguém ser atuado como criminoso racista, a perplexidade do povo diante de qual posição a ser adotada para identificar uma pessoa negra, ou melhor, qual é o vocábulo apropriado. Está se tornando comum a pergunta: - Se alguém é negro, não podemos dizer que ele é negro? A resposta deve ser: pode. A dúvida persiste, e vem a interrogação: - Mas não é crime chamar alguém de negro? E, categoricamente, a resposta deve ser: não.
O que deve ser percebido é que, identificar um branco ou um negro enquanto cidadão é uma coisa; a outra coisa é identificá-los desqualificando-o, humilhando-o. Se, por exemplo, uma jornalista obteve uma informação de que há numa determinada escola uma professora negra, inclusive a única negra da escola, que trabalhou na aula com um texto sobre a revolta da Chibata e a jornalista quer fazer uma matéria sobre o assunto, mas não sabe o nome da professora, ela então pode orientar-se por essa identificação.

Caso diferente seria estar a jornalista no trânsito, e também a professora e, por qualquer motivo, houvesse a identificação no tom de xingamento ou de ofensa.

Há outros casos em que identificar pessoas negras enquantos tais, não é crime. Afinal, estamos a cada dia resgatando essa identificação dentro de um campo afirmativo e de positividade. O que se quer combater mediante a lei são situações nas quais a intenção é desmerecer o outro e, na análise dessas situações, devem ser contemplados vários elementos.

FONTE:

Grupo de Estudos Negros/DSN/UNIPÊ

domingo, 4 de dezembro de 2011

Abolição da Escravatura - Lei Áurea

Abolição da Escravatura - Lei Áurea

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princesa Isabel Princesa Isabel: assinou a Lei Áurea em 13 de maio de 1888

Introdução
Na época em que os portugueses começaram a colonização do Brasil, não existia mão-de-obra para a realização de trabalhos manuais. Diante disso, eles procuraram usar o trabalho dos índios nas lavouras; entretanto, esta escravidão não pôde ser levada adiante, pois os religiosos se colocaram em defesa dos índios condenando sua escravidão. Assim, os portugueses passaram a fazer o mesmo que os demais europeus daquela época. Eles foram à busca de negros na África para submetê-los ao trabalho escravo em sua colônia. Deu-se, assim, a entrada dos escravos no Brasil.
Processo de abolição da escravatura no Brasil
Os negros, trazidos do continente Africano, eram transportados dentro dos porões dos navios negreiros. Devido as péssimas condições deste meio de transporte, muitos deles morriam durante a viagem. Após o desembarque eles eram comprados por fazendeiros e senhores de engenho, que os tratavam de forma cruel e desumana.
Apesar desta prática ser considerada “normal” do ponto de vista da maioria, havia aqueles que eram contra este tipo de abuso. Estes eram os abolicionistas (grupo formado por literatos, religiosos, políticos e pessoas do povo); contudo, esta prática permaneceu por quase 300 anos. O principal fator que manteve a escravidão por um longo período foi o econômico. A economia do país contava somente com o trabalho escravo para realizar as tarefas da roça e outras tão pesados quanto estas. As providências para a libertação dos escravos deveriam ser tomadas lentamente.
A partir de 1870, a região Sul do Brasil passou a empregar assalariados brasileiros e imigrantes estrangeiros; no Norte, as usinas substituíram os primitivos engenhos, fato que permitiu a utilização de um número menor de escravos. Já nas principais cidades, era grande o desejo do surgimento de indústrias.Visando não causar prejuízo aos proprietários, o governo, pressionado pela Inglaterra, foi alcançando seus objetivos aos poucos. O primeiro passo foi dado em 1850, com a extinção do tráfico negreiro. Vinte anos mais tarde, foi declarada a Lei do Ventre-Livre (de 28 de setembro de 1871). Esta lei tornava livre os filhos de escravos que nascessem a partir de sua promulgação.
Em 1885, foi aprovada a lei Saraiva-Cotegipe ou dos Sexagenários que beneficiava os negros de mais de 65 anos. Foi em 13 de maio de 1888, através da Lei Áurea, que liberdade total finalmente foi alcançada pelos negros no Brasil. Esta lei, assinada pela Princesa Isabel, abolia de vez a escravidão no Brasil.
A vida dos negros brasileiros após a abolição
Após a abolição, a vida dos negros brasileiros continuou muito difícil. O estado brasileiro não se preocupou em oferecer condições para que os ex-escravos pudessem ser integrados no mercado de trabalho formal e assalariado. Muitos setores da elite brasileira continuaram com o preconceito. Prova disso, foi a preferência pela mão-de-obra europeia, que aumentou muito no Brasil após a abolição. Portanto, a maioria dos negros encontrou grandes dificuldades para conseguir empregos e manter uma vida com o mínimo de condições necessárias (moradia e educação principalmente).